Talvez catarse não seja uma palavra muito familiar para você, mas tenho certeza que conhecê-la fará muito sentido na sua vida, além do que, você reconhecerá muitos momentos em que viveu um processo de catarse.
Trata-se de um conceito que nasce em Aristóteles, ou seja, e´, antes de tudo, uma reflexão filosófica. Mas ultrapassa a filosofia alcançando as artes, a psicologia e até a medicina. Há uma diversidade de situações catárticas que nos alcançam em nossas vidas e elas constituem momentos de grande relevância na nossa história.
A catarse acontece dentro da gente. É desencadeada por uma ação humana, como quando pedimos perdão ou perdoamos alguém; ou pela arte, como quando assistimos uma peça de teatro ou filme que mexe com alguma coisa dentro de nós; ou também em situações terapêuticas e espirituais, como durante o processo de constelação ou em uma reunião religiosa.
A catarse como quando nossos sentidos despertam alguma emoção em nós. Um evento catártico ele é sentido e não compreendido. Ou seja: é preciso usar mais que a razão e a cognição. Muitas vezes é preciso inclusive neutralizar essa razão.
Esse sentimento muito forte pode se manifestar externamente ou não. Muitas pessoas acreditam que o choro é o único sinal de emotividade, mas não se engane, há coisas extraordinárias que acontecem dentro de nós que não necessariamente se manifestam em forma de choro.
Contudo a catarse não é uma emoção apenas. A catarse acontece como um possível resultado dessa emoção desencadeada. Ela se caracteriza por um profundo sentimento de libertação, de absolvição, de purgação. Nós carregamos pesos que nem ao menos conhecemos. Temos muitas “bolas de ferros” em nossos pés e acabamos naturalizando esses excessos. As situações catárticas nos livram dessas bolas.
Na filosofia a catarse aparece mesmo com o sentido de uma purificação após uma situação de muita força emocional. As tragédias gregas eram consideradas profundamente catárticas: tanto as catarses aconteciam nos personagens que eram encenados, quanto no público que assistia as peças.
Na visão aristotélica, a literatura, o teatro e a música provocam no homem uma sensação de alívio e de reflexão sobre si e sobre a vida, também desencadeiam o remorso e a alegria. A arte, revelar os conflitos humanos, escancarando-os, desperta no expectador o terror, a piedade, o ódio e todos os demais sentimentos que, ao final, leva-os à expiação de suas próprias emoções.
A elevação espiritual catártica não tem diretamente ligação com a espiritualidade, mas sem dúvida podemos afirmar que a espiritualidade também provoca a catarse nas pessoas. A expiação de nossas faltas e os sentimentos de expurgo são muito próprios dos discursos religiosos, dos mais diversos. Na tradição católica, por exemplo, há o momento da confissão dos pecados ao sacerdote.
Uma pessoa que aguarda sua confissão está em sofrimento, tensa por dizer coisas que gostaria de guardar e esquecer, nervosa e ansiosa pelo que irá ouvir do sacerdote, e constitui uma situação de angústia. Contudo, depois de passar pelo constrangimento de ter dito seus pecados, ao sair do confessionário, a sensação é de perdão, alívio e elevação espiritual.
Os processos sistêmicos, como a Constelação e o Psicodrama são fortes promotores de catarse. Há pessoas que defendem que, durante a constelação, as pessoas sofrem, uma vez que observam e vivenciam conteúdos muito dolorosos, mortes, rompimentos familiares, agressões, abortos, muita coisa que, revivida, causa dor, sofrimento e angústia. Isso é verdade. Mas o que a constelação promove não é sofrimento, mas catarse.
Quando uma pessoa visualiza seu mapa familiar no campo quântico, ela reavive as sensações, e isso pode causar um aparente sofrimento. Mas ao final o sentimento não é de uma continuação da dor, mas de uma libertação dessa dor.
A catarse é um sofrimento acompanhado de alívio, como se as prováveis dívidas tivessem sido pagas, a culpa tivesse sido apagada, e, por isso, o sofrimento cessasse. Definitivamente.
Moreno, criador do psicodrama, criou o termo “catarse de integração”. Esse termo vem da observação de que as situações dramáticas, em situação de tratamento psicanalítico em grupos, constituem-se em uma
série de situações de catarse, até dias depois da realização do grupo. Essa catarse acompanha a integração pessoa/grupo; corpo/mente; mente/ espírito; interno/externo; realidade/fantasia.
Catarse de integração também define um processo de catarse em que a catarse de um indivíduo está ligada à do outro. Num processo sistêmico por excelência. É uma ação catártica coletiva, em conjunto. O grupo acolhe, reconhece e potencializa a libertação de cada. O grupo funciona como um potencializador, como um megafone que amplifica os efeitos do fenômeno.
Não se espante, nem tenha medo. Da mesma forma que o Coaching nos revela nossa face e somos obrigados a olhar para nossas sombras, os processos sistêmicos nos provocam esse choque com nossa história. O medo nos impede de caminharmos rumo à libertação do medo.
O psicoterapeuta Wilsson Castelo de Almeida, compilando estudos sobre o termo catarse de integração, sistematizou três formas de catarse em grupo que constam no livro “Psicoterapia Aberta”:
Catarse de integração revolutiva
Nesta forma, o paciente e o grupo passam pelo acontecimento catártico que os revoluciona interiormente, sensibilizando-os e mobilizando-os para novos e oportunos aprofundamentos.
Catarse de integração resolutiva
Nesta forma, o grupo e o paciente têm vivência e consciência de todo material psicológico-existencial
recalcado, reprimido e oprimido. Como um relâmpago, gravam-se-lhes no espírito as possibilidades de um novo universo e um novo crescimento, dos indivíduos e do grupo. São catarses de grande força dramática e estas, sim, são de ocorrência rara e responsáveis por sessões esteticamente belas e emocionalmente significativas.
Catarse de integração evolutiva
Nesta forma, o paciente e o grupo vão somando gradativamente elementos catárticos parciais, surgidos no decorrer do processo. Vão também encampando elementos vivenciados em outros modos de ação, tais como o insight, insight psicodramático, feedbacks, love- backs, confrontos, encontros etc. De sessão a sessão, de dramatização a dramatização, a quantidade e a qualidade dos afetos e da compreensão da dinâmica interrelacional vão se modificando, até que um dia finaliza-se o processo.
As experiências de coletiva são sempre muito mais poderosas, no sentido de transformação, porque precisamos do coletivo, para sermos amados, sentidos, ouvidos e respeitados. O coletivo envolve todo o grupo e depende de uma sólida formação do coach/constelador.
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