No dicionário da língua portuguesa, liturgia é o conjunto dos elementos e práticas do culto religioso (missas, orações, cerimônias, sacramentos, objetos de culto etc.). Já falei um pouco sobre liturgia; e caso você seja
cristão, como eu, talvez você já esteja familiarizado tanto com a palavra quanto com os elementos litúrgicos. Não há nenhuma ritualística que não seja liturgicamente constituída, com sua estrutura de gestos, símbolos, palavras, tempo e espaço.

Sim, podemos entender a liturgia como esse conjunto de elementos e práticas. Como padre, falando a partir da Igreja Católica, um dos maiores erros é reduzirmos o assunto liturgia à celebração da missa e defini-lo apenas como um conjunto de rituais e orações que nos levam ao céu. Essa redução é fruto de uma crescente automação religiosa, que
podemos perceber a cada domingo em nossas assembleias litúrgicas. Muitas vezes, as pessoas vão à missa sem saber o porquê de estarem ali, nem o que está acontecendo perante elas. São meros espectadores do preceito dominical ensinado por seus pais. Talvez seja esse um dos motivos de nós, católicos, sofrermos muitas críticas. Como podemos observar na Constituição Dogmática Sacrosanctum Concilium, parte 7, “Liturgia é uma ação sagrada, através da qual, com ritos, na Igreja e pela Igreja, se exerce e prolonga a obra sacerdotal de Cristo, que tem por objetivos a santificação dos homens e a glorificação de Deus”.

Observe a imagem a seguir. Ela traz todo o Ano Litúrgico referente à Igreja Católica e deixa clara a riqueza que compreende todo o mistério de Deus se fazendo pessoa, caminhando com o seu povo e levando-o à
experiência divinal. No Ano Litúrgico, há Três grandes momentos: Natal — Deus na nossa história; Comunidade — nossa história acompanhada por Deus; Páscoa — nós na história de Deus.

Eu era seminarista quando tive minha primeira explicação sobre liturgia, achei tudo muito confuso e tive resistência total a querer estudar este assunto. Anos depois, como padre e pároco, fui instigado pela minha posição a entender este assunto. E com muita alegria encontrei a imagem reproduzida a seguir. Foi como o Sol logo de manhã, tudo se iluminou, ficou tudo muito claro. Encantado com o entendimento, reproduzi esta imagem na gráfica, distribuí nas missas, utilizei nos grupos pastorais, sobretudo com as lideranças juvenis. E aqui estou eu a despertar você,
leitor, para o que significa a mandala do Ano Litúrgico. Na estrutura mais evidente percebe-se que guardamos três grandes momentos: Natal, Comunidade e Páscoa. O projeto da Salvação de Deus para com o seu povo passa por estes três momentos, estas três grandes dimensões. Assim sendo, observemos a imagem, tomando-a
no sentido horário.

Temos o momento do Natal, dividido em três partes:

1º O advento, que quer dizer “há de chegar.” Quem? O menino Jesus, que está se formando no ventre de Maria;

2º O dia de Natal, que é o nascimento de Jesus;

3º O batismo de Jesus, quando assume a sua vida pública.

Esse momento retrata Deus, que se faz pessoa, nasce em nosso meio, como um de nós, participa da nossa história. É a memória da encarnação do Verbo, da Palavra que é Jesus.

Continuando a observar, temos o tempo comum, que devemos entender como o momento da Comunidade, de assimilar o que aprendemos no Natal. Na Comunidade, crescemos e aprendemos com Jesus. O tempo
comum é dividido em duas partes: a primeira, após o Natal; a segunda, após a Páscoa.

Passado o Natal e o tempo de assimilação de seu aprendizado, chega o ciclo da Quaresma, período de avaliar o convite de Deus a nos desapegarmos da dimensão terrena e vivermos intensamente a dimensão divina. Então, depois, vem o momento da Páscoa, quando celebra-se a Ressurreição de Jesus. Depois, o dia de Pentecostes, quando assumimos a vida divina, isto é, a nossa dimensão espiritual. Portanto, nesta terceira
parte (Pentecostes), compreendemos o ser humano fazendo parte da história de Deus. Isso não significa que eu precise morrer fisicamente, mas, sim, assimilar, mesmo estando no mundo terreno, que este mundo
não me prende, pois eu sou um ser espiritual.

Como eu disse, o tempo comum é dividido em duas partes, uma depois do Natal, e outra depois da Páscoa. Assim, então, continuando a observar a imagem, temos a segunda parte do tempo comum, período de a comunidade assimilar toda a dimensão pascal.

O rito da missa é uma síntese de toda a mandala do Ano Litúrgico, de todo esse projeto de Deus. Paixão, Morte e Ressurreição. No centro da mandala está bem representado este entendimento: Alfa/Ômega, que é o tempo; a cruz, que é a entrega; e o cordeiro, que é a Eucaristia, o Cristo vivo.

Paixão é toda a dimensão terrena do ser humano, desde a sua origem (natal). Morte é passagem. Ressurreição é toda a dimensão espiritual do ser humano. A missa é celebrada por Jesus (sacerdócio) voltada para Deus, tendo a assembleia de discípulos reunida pelo Espírito Santo.

Como o ano tem 365 dias, a Igreja, sabiamente, vivencia a paixão, morte e ressurreição de maneiras diferentes. Para cada tempo, uma dinâmica específica. E também, as muitas festas que fazem parte da caminhada do Povo de Deus, desde Abraão, Moisés, Maria, os apóstolos, pastores, santos e santas surgidos ao longo do tempo. Somos uma Igreja viva, bela, conduzida pelo Espírito Santo. A liturgia é a leitura de toda essa dinamicidade.

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