As três palavras que compõem o título acima formam a estrutura de toda a ritualística cristã. Todo o mistério da fé em Jesus Cristo passa por essas três dimensões, que estruturam o rito cristão. Paixão, Morte e Ressurreição.
Paixão compreende a dimensão da vida humana de forma dual, mas complementar: alegrias e tristezas; gozos e choros; amor e ódio; simpatia e antipatia; amizade e inimizade; liberdade e prisão. É a vida cheia de altos e baixos, em processo de transformação e evolução. É o que dá a certeza de que o ser humano se faz vivo, por isto, dinâmico no tempo. Num tempo, muitas vezes, em desequilíbrio emocional, pois o ser humano tomado na dimensão da paixão ou está muito em alta, ou está muito em baixa. É o ser de sentimentos variados.
A paixão é, assim, um exagero, algo muito intenso e desmedido, por vezes descontrolado. A paixão pode ser vista por muitos como loucura, uma febre, no sentido de uma temperatura acima do natural. A questão é que a febre sempre revela um estado oscilante da paixão. Ela pode durar mais ou menos tempo de acordo com o momento que esteja passando o ser humano. E se ela é constatada, revela um estado anormal da oscilação da vida do corpo humano, seja na sua condição física, seja na sua condição emocional. É preciso gerar o estado de equilíbrio, pois o ser humano não foi criado para estar com febre.
Portanto, a paixão é responsável por alterar aspectos do comportamento do ser humano: pensamento, impulsividade, desespero, inquietação etc. Mas não deve nos fazer entrar em estado de febre. Todas as pessoas podem se apaixonar, isto é, elevar seus sentimentos a qualquer momento, dependendo dos diversos fatores associados a gostos, preferências e referências que cada indivíduo possui. Reações provenientes da paixão geram diferentes situações de comportamentos; por exemplo, quando uma pessoa está apaixonada por outra, um dos principais sintomas é a intensa atração sexual e o desejo de estar na companhia dela. Nesse contexto, a pessoa pensa constantemente no seu alvo, que é a outra pessoa, muitas vezes na mesma condição de paixão. E, juntas, constatam o mesmo grau de sentimentos, de ansiedade, vontade de estarem sempre próximas, entram até em estado de abstinência quando estão separadas e de grande felicidade quando estão juntas.
Nesta mesma linha de interpretação, pode-se perceber a paixão, também, em relação aos objetos e temas específicos. Nesses casos é normal apresentar um excesso de entusiasmo ao falar ou lidar com algo de que se gosta. Em certas situações, quando a paixão é extrema por determinado assunto, o comportamento da pessoa pode beirar o fanatismo.
Do ponto de vista religioso, a Paixão (com letra maiúscula) é entendida como todos os tormentos sofridos por Jesus Cristo antes de ser crucificado. Assim, a Paixão de Cristo é uma expressão usada pelos cristãos para representar o período de martírio que o Messias teria vivido antes de morrer, essa palavra compreende toda sua entrega, toda sua dor, toda sua inteireza, todo seu amor desesperado. A Paixão de Cristo, ainda hoje, é vista por muitos como loucura. “Como alguém pode aceitar todo esse peso, toda essa dor?” Isso só foi possível pela entrega total e absoluta de Jesus aos planos de seu/nosso Pai.
Que plano seria esse? Qual pai desejaria a morte do próprio filho? Jesus poderia ter realizado o plano do Pai sem passar pela cruz. Pois o plano do Pai é a vida em abundância, harmônica. Daí, a morte chega como passagem tranquila para a eternidade, não como interrupção violenta, marcada pela dor. Neste sentido, mais do que pelo plano do Pai, a Paixão de Jesus está relacionada às opções que ele mesmo fez durante a sua vida.
É preciso promover em nossas vidas o equilíbrio e ele só vem por meio do amor. O ser humano fora da sua condição de equilíbrio, está na sua condição de paixão e, dependendo de como esteja reagindo à paixão, se resulta em febre e, possivelmente, em doença. Amor é sinônimo de equilíbrio. O amor deve ser compreendido em três formas: Eros, Filos e Ágape.
O Amor Eros está na dimensão do prazer, do erótico, do gozo. Muito relacionado à pele, à carne, ao que é tocado como matéria corporal. É um amor exigente, a pessoa ama e exige ser amada. Está relacionado ao sexo, ou aos mais variados sentimentos de excitação compartilhados entre pessoas fisicamente atraídas umas pela outras.
O Amor Filos pode remeter a filho, está relacionado à família, aos amigos. É um amor afetuoso, solidário, voltado para pessoas ligadas pelos laços sanguíneos, ou pelo gosto, empatia, que gera profundas relações de amizade. É o amor que precisa ser correspondido, amar e ser amado.
E o Amor Ágape está relacionado à doação, ao interessar-se pelo outro independente de quem ele seja. É o amar de forma gratuita, sem exigência. A pessoa simplesmente ama sem se preocupar se é amada. Biblicamente falando, é o amor de Deus (Lc 6,35; Ro 5,8) .
Amor e paixão precisam caminhar juntos. Paixão sozinha vira febre e pode adoecer o ser humano. Paixão seguida de amor gera equilíbrio. O equilíbrio é a linha que divide os altos e baixos da vida humana. Caminhar de forma equilibrada não é simples; neste sentido, o ser humano está constantemente em estado de paixão, como ser de altos e baixos, mas também sustentado na linha do amor, que lhe garante a boa caminhada.
Na paixão está o amor, porém, quando a paixão entra em estado de febre, ela fica cega para o amor. O amor continua ali, sustentando as durezas do processo, mas nem sempre reconhecido, percebido e valorizado.
Para ilustrar, veja a metáfora das Pegadas na areia, livro da escritora Margaret Fishback Powers: Uma noite eu tive um sonho. Sonhei que estava andando na praia com o Senhor e através do Céu, passavam cenas da minha vida. Para cada cena que se passava, percebi que eram deixados dois pares de pegadas na areia;
Um era meu e o outro do Senhor.
Quando a última cena da minha vida passou
Diante de nós, olhei para trás, para as pegadas
Na areia e notei que muitas vezes, no caminho da
Minha vida havia apenas um par de pegadas na areia.
Notei também, que isso aconteceu nos momentos
Mais difíceis e angustiosos do meu viver.
Isso entristeceu-me deveras, e perguntei
Então ao Senhor.
“— Senhor, Tu me disseste que, uma vez
que eu resolvi Te seguir, Tu andarias sempre comigo todo o caminho, mas notei que durante as maiores atribulações do meu viver havia na areia dos caminhos da vida, apenas um par de pegadas. Não compreendo porque nas horas que mais necessitava de Ti, Tu me deixastes.”
O Senhor me respondeu:
“— Meu precioso filho. Eu te amo e jamais te deixaria nas horas da tua prova e do teu sofrimento. Quando vistes na areia, apenas um par de pegadas, foi exatamente aí que EU, nos braços… Te carreguei.
Nos momentos tranquilos da vida, paixão e amor caminham em harmonia. Nos momentos de desespero, angústias, aflições etc., a paixão simplesmente não enxerga o amor e se acha sozinha fazendo tudo. Mas quem garante que o sucesso aconteça é o amor. Isto, quando a paixão não mata o amor.
A morte. A morte tem tantos significados quanto existem sociedades no mundo. Ela é festejada por alguns e amaldiçoada por outros. Para alguns, ela é um fim; para outros, ela é um começo; para outros, uma passagem. Não há como tratar de morte sem passear pela variedade de significados que ela representa. O sentido da morte está diferentemente representado nas diversas culturas.
Independentemente da cultura e da perspectiva ideológica, a morte é o fim da vida terrestre. Quando encaramos um corpo morto, vemos a realidade de que nossa existência é composta por matéria e essência, alma. O corpo morto conserva nossa matéria, nossa parte orgânica, o que é palpável e visível. O corpo morto também só repousa estático porque sua essência se esvaiu. Logo, o cadáver também nos permite ter a certeza de que não somos apenas matéria e de que há algo mais.
A morte de Jesus estabeleceu um silêncio entre os cristãos. Um silêncio cheio de dúvidas, de sofrimento, de incertezas, de desânimo. Só tendo vencido a morte, Jesus pode nos mostrar como a vida é superior a tudo. No final, não é a morte que vence, é a vida. O Evangelho persiste como o Cristo vivo.
Assim, a morte é uma metáfora do silêncio e da angústia. Embora a morte física seja uma realidade, podemos morrer de diversas formas, sempre que nossa vitalidade se encontra esgotada, apagada, esvaída. Morremos quando desistimos, morremos quando nos silenciamos, morremos quando deixamos que nossa verdade seja soterrada.
Levaram Jesus ao calvário e o crucificaram: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem!” (Lc 23,33).
Desceu o corpo da cruz, enrolou-o num lençol e colocou-o num túmulo escavado na rocha, onde ninguém ainda tinha sido sepultado (Lc 23,53)
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