A linguagem é uma habilidade humana extraordinária. Nós não apenas construímos, ao longo do nosso processo civilizatório, vários sistemas linguísticos, como continuamos sofisticando esses sistemas, criando maneiras de diferentes de nos comunicarmos e conectando o mundo com as tecnologias em rede. Mas há um recurso que rompe todos esses milênios de desenvolvimento linguístico: as histórias.
Nós gostamos de histórias. Elas nos acompanham desde antes de nascermos, e não se pode precisar quando foi que elas passaram a fazer parte do nosso modo de viver, mas sabemos que as pinturas rupestres mais antigas deixaram, nas paredes das cavernas, as histórias que deveriam continuar a ser contadas.
Em termos textuais uma história é uma narrativa que localiza um personagem e um acontecimento no tempo e no espaço. A partir desses elementos cada narrador pode tomar as rédeas da sua própria imaginação e construir suas batalhas, seus romances, nascimentos e mortes, vitórias e derrotas, com ou sem alguma lição moral ao final. As histórias saíram do imaginário, ganharam as páginas dos livros, depois as revistas, em seguida o cinema, as novelas, as series, e as palestras motivacionais. Hoje, não há quem não tenha as suas histórias preferidas, seus personagens e fatos mais marcantes.
Sim, nossa vida é marcada por acontecimentos que ouvimos, lemos ou assistimos. Todo esse mundo de narrativas, mais reais ou mais ficcionais é parte do nosso modo de ser, de viver e de aprender.
Se pensarmos na bíblia, por exemplo, mesmo aqueles que não são cristãos, têm na bíblia um recurso histórico importante, porque antes de ser um texto sagrado, a bíblia é um texto narrativos, com centenas de histórias que continuam a ser contadas de geração em geração. A bíblia não é um livro científico, é um livro de histórias de pessoas e povos, que nos acompanham e que contribuíram para a formação dos valores e do imaginário de grande parte das pessoas.
No meio desse emaranhado de narrativas, uma delas se faz especial e merece a nossa atenção: a sua própria narrativa, ou seja, a forma como você conta suas próprias histórias.
Contar a própria história é um recurso importantíssimo no processo de autoconstrução e autoidentificação. Basta você compreender que a realidade não existe. Nada existe de fato. O mundo e tudo que você vê é só é real a partir da linguagem. Eu explico: imagine que você vá a um museu e se depare com um objeto que você não faz a menor ideia do que seja. Quando você sair desse museu, vai se lembrar de várias coisas, mas dificilmente se lembrará do objeto estranho. E, caso se lembre, saberá dizer muito pouco sobre ele, provavelmente apenas descrevê-lo em sua forma e cores.
Isso acontece porque, mesmo um objeto, precisa mais do que ser real no mundo da matéria, precisa ser real no mundo da linguagem. É preciso dar um nome a ele, dizer para que ele serve, quais seus recursos, seu modo de usar. É a linguagem que faz as coisas serem reais de verdade. Um outro exemplo, talvez mais compreensível, é quando duas pessoas assistem o mesmo fato, um acidente de carro, por exemplo. Depois que o acidente acontece, o fato passa a ser memória, e essa memória só existirá por meio das narrativas das pessoas, e é bom interessante pensar que cada uma das pessoas vai narrar o fato de uma maneira única, por mais que o fato seja o mesmo. Depois do fato acontecido, o que resta são as narrativas, as histórias… ou seja: a linguagem.
Sabendo disso, perceba que toda a nossa vida, depois de termos vivido cada momento, cada emoção, o que nos resta são as histórias para contar. É nesse momento que, a medida que escolhemos um ponto de vista para contar nossa própria história, vamos acreditando nessa metáfora que contamos sobre nós mesmos. Se a história que você conta da sua história é repleta de dor, sofrimento, derrota e estagnação, você provavelmente vai acreditar que é uma pessoa fadada ao fracasso, a má-sorte e ao sofrimento. Mas se você conta a sua própria histórica focado em como sobreviveu a cada crise, como aprendeu com cada luta, e como transcendeu a cada sofrimento, você vai acreditar que é alguém competente, inteligente e capaz.
Depois que o momento passou, é a história que importa. E a forma como você percebe sua própria história, vai gerar os seus significados, suas crenças e, consequentemente, a imagem que você tem de você mesmo.
Importante saber que esse processo não é consciente, até que resolvemos olhar para ele, percebê-lo e, se necessário, modifica-lo. O que quero dizer é que podemos passar a vida inteira contando nossa história pessoal da pior forma possível, e nunca nos darmos conta disso. Mas pode ser que algo aconteça e nos chame a atenção para nossas narrativas e, por conta disso, você passe a olhar para sua história de maneira mais amorosa e se fortalece nesse processo.
Nossa história precisa de perdão e amor. Nós somos seres duais, somos luz e sombra. Nós temos direito de errar. Pessoas muito controladoras sofrem muito com seus próprios erros, porque não admitem o equívoco. Eu quero dizer a vocês que sejam mais amorosos com vocês mesmos. A culpa e o ressentimento geram falta de ousadia. Nos culpamos tanto por ter errado que evitamos arriscar de novo.
Quando você contar novamente a sua história de vida, sua história com seus pais, sua história profissional, a construção da sua família ou qualquer outra, tente olhar com novos olhos e encontrar outras palavras, diferentes das que você tem usado – caso você considere que não tem usado a melhor linguagem. Você vai começar a experimentar uma sensação de orgulho próprio, de automotivação e de força interior. Talvez você não saiba de onde estão vindo esses sentimentos, mas tenha certeza que eles vêm de um processo que eu chamo de ressignificação. Você conseguiu dar novos significados a sua própria história, e o resultado disso é o empoderamento pessoal.
Eu desejo que você tenha muitas narrativas, e que elas sejam sempre cheias de superação, de aprendizado e de bravura. É assim que buscamos – e alcançamos – a melhor versão de quem podemos ser.
José Roberto Marques
Master Coach Sênior
Presidente do Instituto Brasileiro de Coaching – IBC