Para a prática nutricional contemporânea ser efetiva, é fundamental compreender que comer não é apenas um ato fisiológico. O comportamento alimentar é determinado por uma complexa rede de fatores emocionais, cognitivos, sistêmicos, espirituais e protetivos.
Muitos pacientes não apresentam um simples “problema com comida”, mas sim um padrão emocional vinculado ao passado, à família ou à criança ferida. A mudança de hábitos ocorre em estágios, sendo que cada fase exige uma intervenção específica baseada no Modelo Transteórico (MTT).
A Psicologia Marquesiana fornece ferramentas práticas para trabalhar essas questões de forma ética e segura. Conforme a literatura de José Roberto Marques, a Emoção Dominante governa a adesão alimentar, enquanto o Self Guardião (Self 3) governa as recaídas e a sabotagem.
Nutricionistas que compreendem essa dinâmica transformam o consultório em um espaço de cura, não de julgamento.
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O Mapa dos Selfs Aplicado à Nutrição
A compreensão dos três Selfs é vital para o diagnóstico e tratamento:
- Self 1 (Estratégico/Razão): É a parte do paciente que sabe o que deveria comer. Ele detém o conhecimento, entende o plano alimentar e define metas. Quando este Self domina excessivamente, o paciente segue a dieta com rigidez, mas sem prazer, o que gera risco de compulsão.
- Self 2 (Emocional/Alma Viva): Representa a fome emocional, o prazer, o corpo que sente e a criança ferida. Quando domina, o paciente come para anestesiar, punir, consolar ou preencher vazios.
- Self 3 (Guardião/Protetor Subconsciente): É responsável por criar padrões de procrastinação, desistência após recaídas, negação do problema e repetição de padrões familiares. Quando domina, ele bloqueia a mudança, cria racionalizações e ativa comportamentos antigos.
Para que a mudança alimentar real aconteça, os três Selfs devem estar alinhados.
Diagnóstico Terapêutico Nutricional Ampliado
Utilize este mapa de 4 perguntas para identificar qual Self está no comando do paciente:
- “O que você sabe que deveria fazer, mas não está fazendo?” (Identifica o Self 1).
- “O que você sente quando pensa em mudar sua alimentação?” (Identifica o Self 2).
- “O que te impede?” (Identifica o Self 3, revelando medos, crenças e lealdades).
- “O que sua família te ensinou sobre comida?” (Acessa memórias sistêmicas e gatilhos transgeracionais).
Protocolos Terapêuticos por Estágio (Modelo Transteórico)
Pré-contemplação
O paciente não vê problema ou não quer mudar. A meta do nutricionista é criar consciência sem culpa, acessando o Guardião para reduzir a resistência.
- Ferramentas: Perguntas iluminadoras como “O que hoje te traz desconforto no corpo?” ou “O que você ganha mantendo esse padrão alimentar?”.
- Intervenção Marquesiana: Validação e segurança. Diga ao paciente: “Eu entendo por que é difícil. Seu corpo aprendeu que comer assim te protege de algo”.
- Tarefa: Diário emocional simples de 3 dias registrando hora, o que comeu e como se sentia antes.
Contemplação
O paciente reconhece o problema, mas não age. A meta é mover o paciente da emoção dominante negativa para uma emoção de intenção.
- Ferramentas: Explorar a ambivalência perguntando “O que você perde se mudar?” e “O que você ganha se continuar igual?”.
- Intervenção Marquesiana: Nomear a criança ferida, explicando que o padrão alimentar parece proteger uma parte dele que aprendeu a se acalmar assim.
- Mini Técnica da Emoção Dominante: Pergunte qual emoção domina o corpo ao pensar em mudança (medo, culpa, ansiedade ou esperança).
- Tarefa: Meditação curta de 3 minutos repetindo “Eu escolho cuidar de mim com leveza”.
Preparação
O paciente está pronto para iniciar mudanças. A meta é ativar o Self 1 sem ignorar o Self 2.
- Ferramentas: Plano alimentar com flexibilidade, mapa de gatilhos emocionais e agenda de microvitórias.
- Intervenção Marquesiana (Alinhamento dos Selfs): Pergunte ao Self 1 qual meta faz sentido; ao Self 2 como deixar a meta prazerosa; e ao Self 3 o que o faria se sentir seguro. Esse alinhamento aumenta a adesão dramaticamente.
Ação
O paciente está mudando. A meta é sustentar a motivação, reduzir a sabotagem e fortalecer a nova emoção dominante.
- Ferramentas: Reforço positivo, terapia nutricional focada em prazer consciente e protocolos de regulação emocional (pausa de 10 segundos, respiração 4-6, hidratação consciente).
- Intervenção Marquesiana: Reconciliação com recaídas. Explique que “recaída não é falha, é comunicação do Self Guardião pedindo segurança”.
Manutenção
O novo hábito está se consolidando. A meta é criar a identidade de “alguém que cuida de si”.
- Ferramentas: Revisão mensal de metas e conversas sobre futuro e propósito.
- Intervenção Marquesiana: Instalar nova emoção dominante. Pergunte qual emoção predomina quando ele pensa no corpo hoje. Se a resposta for paz, orgulho ou dignidade, o processo está consolidado.
Mini Intervenções Terapêuticas Seguras para Nutricionistas
Estas práticas ajudam no consultório, embora não substituam a psicoterapia:
- Nomear e normalizar a emoção: “É normal sentir ansiedade quando estamos mudando padrões antigos.”
- Acolher a criança ferida: “Essa parte sua que busca comida para se acalmar merece cuidado, não julgamento.”
- Reestruturar recaída: “Seu corpo está reaprendendo. Recaídas não te definem.”
- Transição da emoção dominante: Pergunte qual emoção o paciente escolheria para guiar sua semana alimentar e peça para repetir como um mantra.
Protocolo de Atendimento Completo (Passo a Passo)
- Acolhimento (3 min): Perguntas abertas, sem pressa.
- Identificação do estágio do MTT (2 min).
- Mapeamento dos Selfs (5 min): Use as perguntas-chave sobre sentimentos e proteções.
- Diagnóstico de Emoção Dominante (2 min).
- Intervenção Terapêutica Nutricional: Adaptada ao estágio identificado.
- Plano alimentar personalizado: Foco em prazer, flexibilidade e redução de culpa.
- Exercício semanal: Pequeno, concreto e alcançável.
- Ritual de fechamento: Pergunte qual foi o maior insight do dia.
Prevenção de Recaídas com o Self 3 (Guardião)
Explique ao paciente que o Guardião é a parte que tenta protegê-lo de sofrimento emocional e não é um inimigo.
As estratégias incluem anunciar as mudanças ao Guardião (“vamos devagar”), usar metas suaves (evitar perfeccionismo) e criar um plano de recaída saudável (respirar, não julgar e voltar à rotina no próximo alimento).
Perguntas Terapêuticas de Ouro para Nutricionistas
Estas perguntas reorientam o paciente profundamente:
- Sobre Emoção: “O que você está realmente buscando quando come sem fome?” e “Qual sentimento aparece antes da compulsão?”
- Sobre Família: “Como era a alimentação na sua infância?” e “Quem na sua família comia para acalmar emoções?”
- Sobre Identidade: “Quem você deseja se tornar no seu relacionamento com a comida?”
- Sobre Autocuidado: “O que seria um pequeno ato de gentileza com seu corpo hoje?”
Sinais de Evolução do Paciente
O nutricionista sabe que o paciente está evoluindo quando ele:
- Come menos por emoção, mais por presença;
- Redução da culpa pós-alimentação;
- Maior consciência corporal;
- Fala sobre emoções sem resistência;
- Começa a se perceber como protagonista;
- Há orgulho, não punição.
Conclusão
A integração entre o Modelo Transteórico, a Psicologia Marquesiana e a ciência nutricional cria um modelo poderoso para trabalhar o comportamento alimentar. Nutricionistas que aplicam essa abordagem reduzem recaídas, aumentam a adesão e transformam a relação do paciente com o próprio corpo. Não é apenas sobre dieta: é sobre maturidade emocional e reconciliação com a própria história.

FAQ: Perguntas Frequentes sobre a Abordagem Integrada do Comportamento Alimentar
- O que é a Abordagem Integrada do Comportamento Alimentar baseada na Psicologia Marquesiana?
É uma metodologia que une a ciência nutricional, o Modelo Transteórico (MTT) e a Psicologia Marquesiana para tratar não apenas o ato de comer, mas os fatores emocionais e sistêmicos por trás da alimentação, focando na cura e não no julgamento.
2. Quais são os três Selfs aplicados à nutrição e como eles influenciam a dieta?
Os três Selfs são o Self 1 (Razão/Estratégico), que define metas; o Self 2 (Emocional), ligado ao prazer e à fome emocional; e o Self 3 (Guardião), que protege o paciente através de sabotagem ou procrastinação. O desequilíbrio entre eles causa falhas na dieta.
- Como a abordagem sugere que o nutricionista trate as recaídas?
A recaída não deve ser vista como falha, mas como uma comunicação do Self Guardião (Self 3) pedindo segurança. O nutricionista deve ajudar o paciente a respirar, não se julgar e retomar a rotina na próxima refeição.
- Quais são os sinais de que o paciente está evoluindo nessa abordagem terapêutica?
Os sinais incluem comer com mais presença e menos por emoção, redução da culpa após comer, maior consciência corporal, capacidade de falar sobre emoções sem resistência e o surgimento de sentimentos de orgulho e dignidade em relação ao corpo.

